A história

Fontes de consultas: diversos sites na Internet, os livros "Eles e Eu",
de Luiz Carlos Maciel e Ângela Chaves; "Songbook", de Amir Chediak;
"Ela é Carioca", de Ruy Castro

Da editoria do Jornal dos Amigos

Você gosta de música? Eu adoro, mas sempre a boa música, é claro, desde a erudita até o samba. Mas não me venha com pagode, axé, essas coisas... Outro dia eu estava apreciando na TV Senado o senador Arthur da Távola apresentando um programa de músicas eruditas. Um primor! Mas eu gosto também do samba autêntico. Já dizia o poeta que "quem não gosta de samba, bom sujeito não é. É ruim da cabeça, ou doente do pé...".

A música é uma forma de termos vida interior. A boa música amacia a alma e enobrece o espírito. Sempre que oportuno ouço ou canto uma boa música.

Mas vamos falar de Bossa Nova. Antes de mais nada, para quem é da geração 70 para cá, Bossa Nova é um gênero musical que derivou da música popular. Segundo a enciclopédia da "Folha", foi um movimento iniciado em 1958, no Rio de Janeiro, no sentido de renovar a forma rítmica, harmônica e melódica da música popular da época e com nítida influência do jazz.

A "Folha" diz que essa variação musical apareceu pela primeira vez em um long-play (uma bolacha preta antecessora do CD) de Elizeth Cardoso, com acompanhamento do João Gilberto -considerado o pai da Bossa Nova, mas quem será a mãe?- ao violão. João Gilberto utilizava acordes dissonantes, onde a voz ia para um lado e o acompanhamento para outro e no final dava tudo certo.

Já Almir Shediak conta em seu "Songbook" que a Bossa Nova iniciou-se como um processo em 1940, quando o compositor e pianista Custódio de Mesquita passou a usar em seus sambas-canções certos recursos até então utilizados na música erudita e no jazz americano. Ele revela também que na época um conjunto liderado pelo compositor Garoto (Duas Contas e Fim de Noite) tinha um nome extremamente expressivo: Bossa Clube.

Apareceram também nessa ocasião, navegando naquela onda, Dick Farney e Lúcio Alves.

Na década de 50 começa a aparecer um tal de Alfredo José da Silva fazendo sucesso com suas músicas. Ele ficou conhecido como Johnny Alf, por intermédio das composições "O que é o mar" (1952) e "Rapaz de bem" (1953). Algum tempo depois disponta com seu maior sucesso: "Eu e a brisa".

Bem, mas a verdade verdadeira é que o movimento mesmo de Bossa Nova eclodiu em 1958, com João Gilberto interpretando "Chega de saudade" (Tom Jobim e Vinícius, 1956) e "Outra vez" (Tom Jobim). Foi ao ápice como movimento autêntico até 1962. De lá para cá o que houve foram desdobramentos e novas performances, com a entrada de novos valores no cenário musical. Destaco Elis Regina, Chico Buarque e a tropicália de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Betânia e Gal Costa. Chico Buarque fez parte ativa do movimento de Bossa Nova, realizando até parcerias com Tom e Vinícius de Morais, mas seguiu carreira solo por um outro caminho.

No início dos anos 60 o quarteto "Os Cariocas" desponta como uma tendência musical autêntica da Bossa Nova. Inicialmente o conjunto era formado por Ismael Netto (líder), seu irmão Severino Filho e mais três rapazes. Com a morte de Ismael, Severino assume a liderança e com Quartera, Badeco e Luiz Roberto lança o LP "A Bossa dos Cariocas", que desponta como um grande sucesso. Uma das faixas -"Amor em Paz"-, só vocal, é antológica. Em sua esteira aparecem os trios: Tamba Trio, Zimbo Trio, Os Bossa Três, Jorge Autuori Trio, tendências essas que se tornariam comuns com o aparecimento de outros conjuntos, mas que se dissiparam rapidamente. Vieram depois o Quarteto em Cy e o MPB4.

Mas a Bossa Nova mesmo era feita pelo insubstituível grande maestro, compositor, arranjador, pianista (acho que já o vi tocando flauta também) Antonio Carlos Jobim, que teve incontáveis parceiros. Cito como suas maravilhas musicais: "Chega de saudade, Chovendo na roseira, Desafinado, Vivo sonhando, Corcovado, Este teu olhar, Triste, Só em teus braços, Falando de amor, Insensatez, Samba do avião, Tereza da praia, Estrada do sol, Meditação, Samba de uma nota só, Garota de Ipanema, Só danço samba, Se todos fossem iguais a você, Por toda a minha vida," ufa, e quantas mais!

Os parceiros mais comuns de Jobim foram: o grande poeta Vinicius de Morais, Aloysio de Oliveira, Billy Blanco, Dolores Duran, Marino Pinto, Chico Buarque e Newton Mendonça.

Destaco como os grandes intérpretes autênticos da Bossa Nova, não necessariamente na ordem de importância:

João Gilberto, Johnny Alf, Carlos Lira, Antonio Carlos Jobim, Nara Leão, Sérgio Ricardo, Conjunto Roberto Menescal, Eumir Deodato, Maysa, Toquinho, Vinícius de Morais, Juca Chaves, Baden Pawell, Luiz Bonfá, Tuca, Francis Hime, Sérgio Mendes, Os Cariocas, Tamba Trio, Zimbo Trio, Os Bossa Três, Jorge Autuori Trio, Luiz Eça, Oscar Peterson, Rosinha de Valença, Silvinha Teles, Tito Madi, Oscar Castro Neves, Billy Blanco, Maurício Einhorn, Marcos e Paulo Sérgio Valle, Orlann Divo, Dolores Duran, Conjunto Walter Wanderley.

Os grandes nomes que divulgaram pessoalmente a Bossa Nova no exterior foram: Sérgio Mendes, Eumir Deodato, Walter Wandeley e Antonio Carlos Jobim.

E tem os "por fora", que participaram do movimento de Bossa Nova como compositores, produzindo shows ou simplesmente nos bastidores. Cito a dupla Miéle e Ronaldo Bôscoli, Aloysio de Oliveira, Nelson Motta, Torquato Neto, Capinam, Caetano Veloso, Chico Buarque, Olivia Hime, Paulinho da Viola, Sidney Muller, Elizeth Cardoso, Maria Helena Toledo, João Donato, Braguinha, Bebeto, Durval Ferreira, Lula Freire, Ruy Guerra, Pingarrilho, Pacífico Mascarenhas, Newton Mendonça.

Você pode estar pensando: "Puxa, por que esse cara gosta tanto de Bossa Nova?". Eu explico: Na fase áurea da Bossa Nova eu era adolescente. Morava na Rua João Lira, no Leblon, Rio de Janeiro. Vivi bastante os acontecimentos musicais na ocasião, tendo conhecido pessoas na rua que estavam nessa onda. Era uma época feliz e saudável em que qualquer um que tocasse violão, obviamente tocava Bossa Nova, movimentava reuniões e as garotas apareciam. Naquele tempo havia mais romantismo e menos sexo, até no meio artístico. E a grande maioria das músicas de Bossa Nova fala de coisas do amor ou temas inocentes. Tenho saudades e gosto de relembrar a época.

Agora, para os cariocas saudosistas daquele tempo que não volta mais, abaixo vai uma letra da música que você ouve ao fundo, composta por Toquinho e Vinícius de Morais em homenagem ao grande maestro. Chama-se "Carta ao Tom 74".

Rua Nascimento Silva Cento e Sete,
Você ensinando pra Eliseth,
As canções de "Canção do amor demais",

Lembra que tempo feliz,
Ah! que saudade,
Ipanema era só felicidade,
Era como o amor vivesse em paz.

Nossa famosa garota nem sabia,
A que ponto a cidade turvaria,
Esse Rio de amor que se perdeu,

Mesmo a tristeza da gente era mais bela,
E além disso se via da janela,
Um caminho de céu e o Redentor.

É meu amigo só resta uma certeza,
É preciso acabar com essa tristeza,
É preciso inventar de novo o amor.

Perceba que pela poesia da música, composta em 1974, já havia um tom melancólico da perda de romantismo do Rio. A "nossa famosa garota" é a Helô Pinheiro, que inspirou o poeta a fazer a música "Garota de Ipanema" em 1962.

A foto do Tom ao piano no início desta página foi em seu famoso apartamento.

Mas como você pode perceber, sou fã de carteirinha do Tom Jobim. Lembro-me que tentei conhecê-lo pessoalmente.

Digo que tentei porque sempre fui muito tímido para chegar e falar com o maestro. Mas sabedor de que ele freqüentava aos sábados pelas manhãs o restaurante Plataforma (fica ou ficava em frente ao campo do Flamengo, na Gávea), fui até lá para vê-lo. Sorte minha, porque ele apareceu e ficou distante cerca de uns dois metros de minha mesa, em lugar cativo reservado pelos garçons.

Serviram-no seu indefectível chope "pipoca" (servido em copo de uísque) e fui incapaz de incomodá-lo. Mas fiquei satisfeito em ver pessoalmente o mestre genial da Bossa Nova. Isso aconteceu em um sábado qualquer na década de 70.


Tom Jobim e Vinicius de Moraes
por Biagio Di Carlo, Italia
Crédito: www.jobim.com.br

Existe uma promessa de produção de um programa de Bossa Nova aqui, numa rádio de Belo Horizonte. A idéia é contar "causos" que aconteceram nos bastidores, fatos políticos e artísticos da época e "tome Bossa Nova". E o horário não poderia ser melhor: 11 da noite. Estou aguardando apenas o sinal verde da direção da rádio interessada nessa produção.

Ver mais


Música de fundo em arquivo MID (experimental):
"Carta ao Tom 74 ", de Toquinho e Vinícius de Morais

Participe do Jornal dos Amigos,
cada vez mais um jornal cidadão

O Jornal dos Amigos agradece a seus colaboradores e incentiva os leitores a enviarem textos, fotos ou ilustrações com sugestões de idéias, artigos, poesias, crônicas, amenidades, anedotas, receitas culinárias, casos interessantes, qualquer coisa que possa interessar a seus amigos. Escreva para o e-mail:

Se o conteúdo estiver de acordo com a linha editorial do jornal, será publicado.

Não esqueça de citar seu nome, a cidade de origem e a fonte da informação.

Solicitamos a nossos colaboradores que, ao enviarem seus textos, retirem as "flechas", isto é, limpem os textos daquelas "sujeiras" de reenvio do e-mail. Isso facilita bastante para nós na diagramação.

Início da página

www.jornaldosamigos.com.br


Belo Horizonte, 9 dezembro, 2006

No tempo da Bossa Nova