Visão dos Estados Unidos sobre o mundo

 
Enviado por Joni Lopes, Rio de Janeiro-Capital


 

 


A Bolívia é dos bolivianos, e o Brasil, de quem é?

Enviada pela autora, Alegrete-RS

 
Por Sandra Silva, socióloga e professora

E-mail: sandra.silva@brturbo.com.br
 

14 maio, 2006

A questão da nacionalização dos recursos naturais bolivianos por seu governo não deveria ter causado tanta estupefação no Brasil ou em qualquer outra nação. Afinal, quando em campanha para a presidência, o então candidato Evo Morales repetiu dezenas, senão centenas de vezes, que nacionalizaria os recursos naturais do país, caso vitorioso. Apenas cumpriu com o prometido. Aliás, se olharmos por esse lado, fez o que muitos candidatos, em qualquer lugar do mundo, não costumam fazer, ou seja, cumprir com o discurso eleitoral.


Tem-se lido e ouvido análises sobre o ato do presidente boliviano que atingiu no peito a petrolífera Petrobrás e, por decorrência, as indústrias brasileiras que utilizam o gás natural. Todavia, pouco se tem sabido a respeito das regras contratuais em que esse negócio foi firmado na década de 90. Em face do desconhecimento dos termos do contrato firmado entre as duas nações e a empresa que assumiu o risco e o investimento, tudo o que se disser pode chegar à beira do ridículo ou da inverdade.

Não se pode admitir que tal empreendimento tenha sido realizado sem as bases do Direito Internacional, sob pena de serem levados à corte penal aqueles que porventura assim tenham procedido. Ora, o Direito Internacional existe justamente para regular os direitos e deveres das pessoas físicas e jurídicas de interesse para a sociedade internacional visando estabelecer a paz e a justiça e a promover o desenvolvimento. Investir em outros países é, pois, da regra que busca desenvolvimento para os envolvidos.

Tem-se falado muito que o Brasil foi ofendido em sua soberania. Repito: no desconhecimento do contrato, nem isso é possível assegurar. Temos sido contumazes algozes do governo que se instalou no país com 53 milhões de votos sob os pilares da ética e da lisura e acabou nessa lama fétida que enoja a todos que ainda mantêm retidão e princípios. Mas não se pode, em razão disso, colocar todos os fatos no mesmo patamar defecatório. A impressão que se tem é que falta perspicácia ao governo em face das crises a que vem sendo submetido. Carece o presidente de assessoria (ou ele é teimoso demais para acolher idéias) para, dignamente vir a público, esclarecer fatos que cutucam os brios nacionais.

A questão da soberania é muito especial. Para acirrar ânimos não se precisa muito esforço e às portas do campeonato mundial de futebol o sentimento cívico de brasilidade sempre toma formas gigantescas. Portanto, para evitar a velha máxima de que inocentes sejam atingidos, é de bom alvitre que se esclareça melhor toda essa pendenga.

Rousseau, no Contrato Social, teceu que a soberania popular estava no povo e a todos pertencia fundamentando a igualdade política dos cidadãos e o sufrágio universal, cujo exercício se daria através dos direitos políticos. Posteriormente, J. J. Canotilho, evoluiu a questão para soberania nacional aonde a titularidade vai para a nação que representa o povo organizado. A diferença entre a doutrina de um e outro está na participação política, pois enquanto Rousseau reconhece a todos os direitos políticos, Canotilho limita a soberania nacional àqueles investidos pela nação na escolha dos governantes. Posteriormente à Revolução Francesa os Estados que se organizaram em Democracias Constitucionais tomaram a soberania como una, indivisível e imprescritível.

Espera-se, portanto, que as regras contratuais do negócio realizado entre Brasil e Bolívia sejam observadas rigorosamente. Não há contratos sem a obrigatoriedade da convenção entre as partes, portanto, se houve descumprimento de regras, acionem-se os mecanismos legais. Se isto não for feito, aí sim, haverá legitimidade para que a sociedade exija uma postura do governo à altura de nossa soberania perante o mundo.
Todo o resto que anda por aí beira a discurso fútil, senão inútil.


Gás da Bolívia
Enviado pelo autor, Rio de Janeiro-Capital

"Darei minha vida pela nacionalização"
Evo Morales reafirma sua disposição em defender os recursos naturais da Bolívia (em 4/4/2006)

Por Gustavo Barreto, editor da revista eletrônica www.fazendomedia.com
E-mail: gustavo@fazendomedia.com

O presidente da Bolívia, Evo Morales, participou nesta segunda (3 de abril) da abertura da 47ª Reunião do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Ao discursar, defendeu que os países da América Latina e do Caribe tenham parceiros interessados em investir, e não em saquear os recursos naturais. "Queremos sócios e não patrões", disse Morales. Segundo a Agência Brasil, o boliviano defendeu que os acordos comerciais precisam beneficiar os pequenos empresários e agricultores, sem eliminar os mercados internos.

De acordo com o presidente da Bolívia, o país passa por uma refundação e está disposto a sair do estado colonial. "Haverá uma revolução democrática e cultural, com base nos povos nacionais. Não somos vingativos e rancorosos. Mas fomos vítimas de processos que massacraram o povo", argumentou. E não ficou só nas palavras: o presidente já marcou para 12 de julho de 2006 a nacionalização de todos os recursos naturais do país. E disse: "Daria minha vida pela nacionalização dos recursos naturais". O governo boliviano pretende aprofundar uma reforma no setor petrolífero de modo a retirar mais benefícios do negócio e aumentar a participação estatal no setor. A nacionalização também inclui os recursos hídricos.

Riquezas nacionais versus "investimentos" externos

Morales ressaltou no mês passado que não pretende confiscar bens das empresas presentes no país, mas deixou claro que está em curso na Bolívia um processo de nacionalização das riquezas da Nação. A princípio, os investimentos externos sempre são positivos, desde que a maior parte dos dividendos seja revertida em prol das comunidades locais e do bem estar social do país. A entrega de parte do patrimônio nacional a preços irrisórios costuma aparecer na grande imprensa como "fatores de atração dos investidores". E nesta semana não foi diferente: a imprensa brasileira tratou a questão como "uma ameaça ao investimento de US$ 1,5 bilhão da Petrobrás" (Rede Globo - Jornal Nacional, 3/4/2006), ignorando os direitos fundamentais do povo boliviano, historicamente desrespeitados.

Em entrevista em janeiro deste ano, o presidente da então esvaziada estatal petrolífera boliviana - a Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolivia (YPFB)1 -, Jorge Alvarado, disse que a intenção do governo era estabelecer empresas mistas na área de gás. De acordo com a nova lei de hidrocarbonetos2, a YPFB possui maior poder sobre as diversas etapas de exploração dos recursos. "Com a lei anterior, a YPFB não podia participar de toda a cadeia de hidrocarbonetos. Não podia explorar, exportar, transportar, comercializar e industrializar gás natural", lembra.3

Durante um ato de lançamento de um programa de alfabetização em massa em que Morales estava presente, o prefeito de Camiri, Gonzalo Moreno, disse que estava "disposto a se sacrificar pela refundação da Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos. "Se até 12 de julho não se refundar a YPFB, este homem irá sacrificar sua vida em um ato público", prometeu Moreno, falando sobre si mesmo. Foi neste momento que Morales respondeu: "Se você, prefeito, vai dar sua vida pela refundação da YPFB, eu darei a minha vida pela nacionalização dos recursos naturais".4

Camiri é constituída basicamente por uma população indígena de origem Guarani, seguida de imigrantes e aymaras (a mesma origem de Morales). É de certa forma uma cidade estratégica, por fazer fronteira com a Argentina e o Paraguai. Além disso, possui lugares de interesse histórico e turístico. É em Camiri que se encontra o maior centro de serviços da YPFB.

Posição do Itamaraty

Como maior investidora do setor na Bolívia, a empresa petrolífera brasileira Petrobras acompanha com grande interesse as negociações. Em entrevista à Agência Brasil no último domingo (2/4), o secretário especial de Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, disse que o Brasil vai respeitar a decisão do governo boliviano de nacionalizar as reservas de gás e petróleo. Segundo ele, o que não está claro para o Brasil são as garantias que a Bolívia dará à Petrobrás e a outras empresas que têm investimentos na exploração de gás e petróleo naquele país. A questão foi discutida em café-da-manhã que reuniu Garcia, o secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, o subsecretário para Assuntos da América Latina, José Eduardo Martins Felicio, e o presidente da Bolívia, Evo Morales.
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1 - "Yacimientos" quer dizer jazidas em espanhol.
2 - Lei 3058, de 17/5/2005, disponível em http://www.superhid.gov.bo/public/
LST_MARCOLEGAL_18_upLoad.pdf
3 - Entrevista na Argenpress.info, em http://www.argenpress.info/nota.asp?num=027616
4 - "Morales decretará la nacionalización hasta el 12 de julio", jornal La Razón, 21/3/2006, em http://larazon.glradio.com/versiones/20060321_005487/nota_248_261606.htm


Especial

Guantânamo: a honra ofendida da humanidade
Enviado por Gustavo Barreto, Rio de Janeiro-Capital

Por Mário Maestri, historiador

Fonte: FazendoMedia.com
8 março, 2006

Relatório apresentado em fevereiro de 2006, em Genebra, sob encomenda da Comissão dos Direitos Humanos da ONU, afirma que, sobretudo no referente ao tempo de detenção e ao isolamento, as "condições gerais de detenção" na prisão de Guantânamo constituem indiscutivelmente tratamento "desumano". Os cinco especialistas responsáveis pelo relatório assinalam, com retenção, que, em "certos casos", o tratamento ministrado aos detidos "aparenta-se" a torturas. Pedem a revogação pelo Departamento de Defesa estadunidense da autorização de "técnicas especiais de interrogatório" e recomendam o encerramento da prisão e julgamento imediato dos seus 520 prisioneiros.

Assim, finalmente a ONU dá os primeiros e tímidos passos em direção à recriminação do espetáculo monstruoso praticado, diante dos olhos estarrecidos da opinião pública mundial, nos últimos quatro anos, desde a fundação, em desrespeito aos mais elementares direitos humanos e jurídicos, de campo de concentração para prisioneiros políticos, na baía de Guantânamo, em território cubano que os USA ocupam, ao arrepio da legalidade internacional, também sem qualquer condenação da ONU.

Ao dissociar-se das conclusões mais positivas do relatório pedido por instituição do organismo que preside, Kofi Annan, secretário geral da ONU, propôs que, "mais cedo ou mais tarde", o campo deveria ser fechado, sendo, por seu envergonhado pronunciamento, repreendido prontamente por Donald Rumsfeld, secretário da Defesa dos Estados Unidos, que afirmou: "Ele está completamente errado. Não devemos fechar Guantânamo. Temos várias centenas de terroristas, pessoas más [sic], pessoas que, se voltassem à ação, tentariam matar americanos."

Eu não sabia, eu não queria

Diante da crescente oposição mundial, os mais próximos e subservientes aliados do governo Bush apressaram-se em tomar distância quanto à manutenção do campo. Um dia após a divulgação do relatório, Tony Blair, premiê britânico, propôs que sempre considerara a prisão uma "anomalia". O governo Berlusconi, que mantém também tropas no Iraque e no Afeganistão, defendeu, por sua vez, a necessidade de conciliar a "luta contra o terrorismo com a proteção dos direitos e da dignidade dos homens".

John Sentamu, arcebispo africano de York da Igreja Anglicana, foi mais explícito. Propôs que o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos acuse a administração Bush diante dos tribunais estadunidense e internacionais, caso não cumpra a recomendação. O arcebispo propôs: "O pilar de qualquer sociedade democrática é que todos são iguais perante a lei, inocente até que se prove o contrário, e todos têm direito à representação legal."

O campo de prisioneiro de Guantânamo não constitui inábil iniciativa da administração Bush, excrescência conservadora possível de ser desmontada e superada devido ao seu caráter negativo na campanha mundial contra o "terror". Sua fundação, em janeiro de 2002, constituiu pensada iniciativa com função precisa no âmbito do ambicioso movimento que visa a submissão de princípios, práticas e instituições, nacionais e internacionais.

Campanha mundial

Em 11 de setembro de 2001, o ataque terrorista integralista islâmico às Torres Gêmeas de Nova Iorque prestou valiosa ajuda ao governo Bush, que pôde superar a falta de credibilidade e apoio interno nascidos de vitória eleitoral conquistada através de golpe jurídico e colocar em marcha, com vastíssimo apoio nacional e internacional, o antigo projeto republicano de submissão colonial das reservas petrolíferas mundiais que escapavam ao domínio yanquee.

O primeiro passo na ambiciosa campanha estadunidense foi o ataque tático ao governo talibã que recebera, anos antes, sua ajuda militar no combate à revolução laica e socialista afegã que ensejou a intervenção soviética. Após a dispersão desse governo integralista, a administração Bush promoveu a construção de campo de prisioneiros, fora das fronteiras nacionais USA, para três mil prisioneiros, inaugurado com uns 160 militantes da Al Qaeda e afegãos, acrescidos a seguir de detentos de quarenta nacionalidades.

A definição dos prisioneiros do Afeganistão, Iraque e de outras regiões do mundo, envolvidos ou pretensamente envolvidos em ação anti-estadunidenses, como "combatentes inimigos", e não "prisioneiros de guerra", criou excrescência jurídica em contradição com o direito internacional, ao colocar os prisioneiros em limbo jurídico, à margem de quaisquer salvaguardas. Os "combatentes inimigos" seriam julgados quando a administração militar quisesse, sem assistência jurídica autônoma, por tribunais militares secretos, se necessário.

A escolha do local da prisão não foi aleatória. A base naval de Guantânamo, no sudeste de Cuba, com 170 km2, foi fundada quando da invasão de Cuba, em 1898-1902. Em 2 de julho de 1903, o governo USA ditou à administração títere do país a entrega da baía, por tempo indeterminado, por cinco mil dólares anuais, que paga, hipócrita e religiosamente, cada ano. A definição de Guantânamo como sede do sinistro campo de concentração constituiu uma outra agressão ao povo cubano e latino-americano.

Espetáculo mundial

Assim, há mais de quatro anos, os prisioneiros foram encerrados, inicialmente no sinistro Campo X-Ray de Guantânamo, em jaulas de malha arame, de dois metros por três. Atados pelas mãos e pés, olhos, boca e ouvidos tapados, portando sinistros macacões laranja, foram submetidos, por longos intervalos, a espancamento, altas e baixas temperaturas, ruídos infernais, privação de sono. Sem direito a contatos pessoais, receberam injeções paralizantes, medicação forçada, alimentação violenta, quando ensandeceram ou ensaiavam desesperados atos de resistência. Responsável por Guantânamo, o general Geoffrey Miller definiu o princípio geral que rege a prisão: "Eles são como cães, e se você os deixa acreditar em algum momento que são mais do que cães, então você perdeu controle sobre eles".

Porém, por paradoxal que pareça, o terrível campo de Guantânamo não é sequer de longe o mais sinistro centro de detenção estadunidense, fora dos USA. Ao contrário, talvez seja aquele em que os presos gozam de maiores garantias. Sabe-se que, em países complacentes, sobretudo da Europa e da Ásia, em prisões clandestinas, prisioneiros fantasmas, suspeitos de poder fornecer informações, são torturados - e até mortos, se necessário -, pois sequer se reconhece suas prisões.

É também do conhecimento mundial a complacência dos governos europeus para com o uso de seus aeroportos por aviões fantasmas da CIA, na transferência desses prisioneiros sem registro, em centenas de vôos da morte que as autoridades européias jamais viram, como jamais foram vistos os milhares de vagões sinistros que circularam através da Europa, com as portas lacradas, transportando milhões de velhos, adultos, jovens e crianças para os campos de extermínio nazistas.

O importante em Guantânamo não é a obtenção de informação. Sua função principal é de explicitar a prerrogativa estadunidense de negar os direitos humanos e civis mínimos, de qualquer cidadão, segundo suas necessidades. Ali se encontram prisioneiros capturados, quase ao acaso, nas operações iniciais no Afeganistão que, não raro, sequer sabem, ao igual que os carcereiros, por que estão presos. Alguns têm treze, outros, oitenta.

Vitrine pedagógica

O tratamento desumano de Guantânamo não é resultado do excesso de carcereiros sádicos ou mal-treinados. São ações planejadas e determinadas, em detalhes, pelo Departamento de Estado, executadas diante dos olhos da opinião pública mundial, para criar aceitação passiva que ensejasse, finalmente, o reconhecimento do direito legal do exercício de violência sem limites contra prisioneiros políticos e de opinião.

Na Alta Idade Média, entre os direitos feudais mais draconianos estaria o de estripar um servo, no inverno, para aquecer os pés dos senhores. A função principal desse direito -efetivado, é crível, raramente- era constituir prerrogativa legal dos dominadores que enterrava, nas profundidades da consciência dos dominados, o terror pânico e a idéia da superioridade de seres capazes de exercer, legalmente, ato tão extremo.

O direito de tortura moderada de palestinos, reconhecido no passado pela Corte Suprema de Israel, tinha como principal objetivo, não legalizar atos criminais de militares e policiais, mas neutralizar, através do medo da tortura institucionalizada, a oposição das populações dos territórios ocupados. O Departamento do Estado organizou a prisão de Guantânamo e orquestrou a defesa, nos Estados Unidos e no mundo, da legalidade da tortura de prisioneiros políticos. Assim como o governo inglês tentou institucionalizar o direito de execução sumária de suspeitos de terrorismo, quando da criminal ação que vitimou um brasileiro.

Doutores da morte

Defendendo a tortura, intelectuais registraram a que ponto a barbárie invade a humanidade, sob o domínio do capitalismo em sua fase senil. O psiquiatra e doutor por Harvard Charles Krauthammer, colunista do "The Washington Post", defendeu o caráter ético e o "dever moral" de "pendurar" um possível terrorista "pelos polegares". Alan Dershowitz, catedrático de direito em Harvard, propôs legislação que permita submeter a "dor atroz" um prisioneiro, desde que não se deixe marcas! Fritz Allhoff, filósofo da Universidade Western Michigan, defendeu leque legal de técnicas de interrogatório que comportaria "privação de comida", "cargas elétricas", "asfixia por afogamento", "arrancar as unhas" etc.

Com a prisão de Guantânamo, o imperialismo estadunidense busca atribuir-se o direito de prender, em qualquer parte do mundo, cidadãos, de qualquer idade, sexo e nacionalidade - à exclusão, ainda, de estadunidenses - e submetê-los à tortura e à prisão, sem julgamento e sem reconhecimento de direitos, pelo tempo que quiserem. Trata-se de projeto de aniquilamento dos direitos humanos, democráticos, civis e nacionais jamais proposto, até agora, em forma aberta e pública. Tudo em nome da luta contra as "forças do mal", ou seja, contra todos que se opuserem às necessidades imperiais.

Se o nazi-fascismo tivesse vencido, a execução e eliminação de judeus, comunistas, ciganos etc., exercida em forma multitudinária, mas clandestina, antes e durante a Segunda Guerra, teria certamente sido retirada da ilegalidade e semi-ilegalidade e elevada ao nível de exercício de ato legal, para melhor manter na submissão, pelo terror, as populações da Europa.

O exercício do terror apóia-se necessariamente em posição de dominação, para impor a dominação. A inesperada resistência iraquiana e afegã, a crescente mobilização social mundial e, finalmente, as manifestações antiimperialistas islâmicas ensejadas pelas charges dinamarquesas debilitaram o consenso imposto pela administração Bush aos seus aliadas, no que se refere ao projeto imperial de legalização do exercício do terror e de negação de direitos civis, democráticos, individuais e nacionais.

No sábado passado, ao unir-se ao coro mundial que pede fim da prisão de Guantânamo, o The New York Times avançou em algumas das razões da atual dissociação por governos e instituições ocidentais sobre fatos que se arrastam há quatro anos: "Quem necessita de pequenas histórias imaturas para incitar o mundo muçulmano quando se tem o sistema de prisão da administração Bush? Uma razão pela qual a Casa Branca se encontra tão impotente contra a violência gerada pelas charges dinamarquesas é que desperdiçou muita de sua moral em Guantânamo e Abu Ghraib." Ou seja, quando os povos lutam como leões, e de bom alvitre não tratá-las como cães!

O governo Lula da Silva tem-se desdobrado no apoio às políticas externas estadunidenses: integra com destaque na ocupação militar do Haiti; votou servilmente quando do envio do Irã ao Conselho de Segurança, por exercer direito nacional; participou da exigência de prosseguimento da investigação do governo sírio pelo assassinato de Hariri, etc. Apesar de hospedar em suas filas alguns ex-presos políticos, enfeitiçados pelas delícias do exercício do poder em nome dos poderosos, não emitiu até agora sequer um muxoxo sobre o campo de prisioneiros. Se algum dia perguntarem a Lula da Silva sobre o silêncio cúmplice, dirá certamente que "não sabia de nada" sobre Guantânamo.

Ver edição anterior


Música de fundo em arquivo MID (experimental):
"Meu mundo", de Guilherme Arantes
Nota para a seqüência MIDI: *****

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Belo Horizonte, 28 maio, 2006

Política internacional