Estrada ou ferrovia na floresta?

Por Aldem Bourscheit

Fonte: Vozes do clima
30 abril, 2009

 

Foto PPBio/Inpa

Rodovia em meio à floresta

 

Depois de serem contestadas na Justiça, as audiências públicas sobre o asfaltamento da BR-319 foram liberadas e realizadas esta semana em cidades de Rondônia e do Amazonas. A rodovia é uma das inúmeras obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e ligará as capitais daqueles dois estados. Também é foco de nova polêmica entre governo e ambientalistas. Esses últimos afirmam que o asfalto irá acelerar mesmo é o desmatamento e preferem trilhos em meio a 400 quilômetros de floresta ainda bem preservada.

Estudos de entidades civis vêm mostrando que a abertura ou a consolidação de estradas na Amazônia é um dos principais estímulos à derrubada de matas, em áreas públicas ou dentro de parques nacionais e terras indígenas. Elas facilitam o acesso de qualquer pessoa à região, incluindo migrantes, posseiros, grileiros, madeireiros e pecuaristas, onde falta presença e controle governamental sobre atividades legais e ilegais.

“O grande salto no desmatamento se dá não necessariamente pela abertura das estradas, mas principalmente por seu asfaltamento”, lembrou o pesquisador Paulo Moutinho, do não-governamental Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

Uma análise sobre o caso, feita pela organização não-governamental Fundo para Conservação Estratégica, braço nacional de uma entidade norte-americana especializada em estudos econômicos sobre projetos que afetam o meio ambiente, mostrou um prejuízo mínimo de R$ 315 milhões nos próximos 25 anos, só observando mudanças nos meios de transporte de passageiros e de cargas. E no pior ângulo, incluindo custos ambientais, como desmatamento, perdas de biodiversidade e a emissão de gases que esquentam o planeta, a conta negativa chegaria a R$ 2,2 bilhões.

Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais estimaram que o desmate na região chegue a 4 milhões de hectares, até 2030.

Aberta pelo Exército em 1973, a rodovia só é transitável hoje perto das capitais Manaus e Porto Velho. A porção central está abandonada desde 1986. Esse fato também foi motivo de discórdia entre os ministérios dos Transportes e do Meio Ambiente, ainda na gestão Marina Silva. Para o primeiro, a obra é apenas uma reforma; para o segunda, trata-se de novo empreendimento, passível de licenciamento ambiental.

Esse é um dos motivos oficiais levantados pelo governo para não ter elaborado um estudo próprio para demonstrar que os benefícios da obra compensarão seus custos, como a lei obriga em projetos de grande porte. O governo também promete criar uma “carapaça” com cerca de 9 milhões de hectares em áreas protegidas no entorno da rodovia para evitar a destruição das florestas.

Reconhecido como um dos maiores pesquisadores sobre Amazônia em atividade no país, Philip Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), vem afirmando com todas as letras que o transporte fluvial ou ferroviário seria mais barato e lógico para a região, além de que uma rodovia seria uma ligação direta da região preservada no Amazonas ao foco de desmatamento que avança a partir do devastado estado de Rondônia.

Ele lembra da estrada de Ferro Carajás, usada pela Vale do Rio Doce, no trecho entre o Maranhão e o Pará. Para o pesquisador, os trilhos provocaram danos ambientais, mas bem menores do que uma rodovia ligando as mesmas regiões.

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Imagem Ministério dos Transportes

BR-319 ligando Porto Velho a Manaus

 

Coordenador-científico do Ipam, Paulo Moutinho afirma não entender os motivos governistas para insistir no asfaltamento de uma rodovia inviável dos pontos de vista econômico e ambiental e que promete levar destruição a um dos trechos mais preservados da Amazônia.

“O problema parece ser o momento político pautando a cabeça dos governantes, já que não há viabilidade econômica ou ecológica para a obra. Ela não faz o mínimo sentido. A rodovia cortará a Amazônia na sua parte mais conservada sem nenhuma razão aparente a não ser eleitoreira”, ressaltou.

O pesquisador lembrou que a situação da BR-319 é bem diferente da verificada antes do asfaltamento da BR-163, entre Cuiabá (MT) e Santarém (PA). Nessa última, havia ocupação humana e desmatamentos mais acentuados no entorno da estrada.

“Nada disso acontece no entorno da 319”, disse. “A BR-319 também levará prejuízos ambientais ao Amazonas, estado que vem avançando em medidas legislativas no setor, inclusive sobre mudanças do clima. Ignorar os custos socioambientais e climáticos em investimentos de infra-estrutura é simplesmente aumentar prejuízos futuros do país”, avaliou Moutinho.

Observando a pesquisa Datafolha divulgada ontem, onde 94% dos brasileiros entrevistados disseram preferir menos desmatamento, mesmo com queda na produção e aumento de preços. Também afirmaram que não votarão em candidatos que defendem a derrubada de florestas no país. “Quem ainda acha que desmatamento dá voto, pode cair do cavalo”, completou Moutinho.

Juntos, o PAC e a IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana), projetam a instalação de dezenas de rodovias, gasodutos, barragens e outras obras na Amazônia.

Confira aqui o texto BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial de conectar o arco de desmatamento à Amazônia Central de Philip Fearnside.

Obras do PAC na Amazônia

Fonte: Instituto Socioambiental (ISA)

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"Sanfona", de Egberto Gismonti
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