O lamentável
expediente da guerra
Enviado pelo autor
O
desapontamento com desvario humano levara, por exemplo, Adorno
a mencionar que não poderia haver mais poesia depois
de Auschwitz
Por
Luiz Alberto Machado, escritor e poeta
www.luizalbertomachado.com.br
25 setembro, 2009
Agora, falando sério:
estamos em pé de guerra! Aliás, estamos mesmo
no centro de uma terrível guerra. E mais: lívidos,
transidos de pavor e com o coração na mão
mediante as estatísticas mais desalentadoras, malgrado
as convenções e tratados internacionais de paz,
malgrado toda legislação regendo condutas e tudo
o que se possa imaginar. Indubitavelmente é o paradoxo
do gigantesco aparato da ordem produzindo a parafernália
caótica da desordem. Acredite se quiser.
É como se num caleidoscópio víssemos todas
as agressões e vinditas, todos os sanguinolentos conflitos,
remontando desde as campanhas do império assírio
e neobabilônico, as greco-persas, as de Alexandre Magno,
as púnicas, as do império romano, as invasões
bárbaras e árabes, as cruzadas, as do império
otomano, as dos sete, dos trinta e dos cem anos.
Credite-se mais o sangreiro da revolução francesa,
os conflitos da primeira e segunda grandes guerras mundiais,
e as muitas que se fizeram e fazem eclodir depois da Organização
das Nações Unidas e da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, como as do Vietnam, do golfo,
a balcânica, a atual contra o terrorismo, fora as de sobrevivência
na África e de outras regiões em conflitos eternos.
Parece-me, depois de tudo isso,
que em nenhum momento a humanidade realmente gozou a paz. Há
sempre o estrépito de um conflito aqui ou ali, no planeta.
Cá para nós, esses
sangrentos ocorridos, principalmente os que se deram depois
da última grande guerra até hoje, só invalidam
todas as tentativas de respeito ao ser humano e à esperança
de um mundo melhor e mais justo, discutindo-se, portanto, afinal,
qual é mesmo o papel das Nações Unidas,
se ela sempre sucumbe ao poderio hegemônico dos interesses
masi aviltantes.
O desapontamento com desvario
humano levara, por exemplo, Adorno a mencionar que não
poderia haver mais poesia depois de Auschwitz. Realmente, um
lamentável episódio na página da tragédia
humana. Não só esse, como muitos e tantos outros
registrados na crônica do inventário humano. E
isto torna quase desnecessário dizer, para nossa maior
incredulidade, que entre animais da mesma espécie, quase
nunca o confronto aberto conduz à morte do opositor.
Isto, claro, sem contar a domesticação de alguns
animais pelo homem, prontos para a briga e o ataque, deixando-nos,
enfim, parecer ser exclusiva ao ser humano a beligerância,
e deixando antever a iminente degeneração nessa
agressão violenta permitida, tornando a todos prisioneiros
num barril de pólvora de uma guerra letal.
Dá-me a impressão
de que quando pensamos que tudo está em ordem, o obscurantismo
triunfa e os postulados de Sun Tzu está mais que vigente
nesse tempo de desenfreada competição globalizada.
Competir e vencer, como se isso fosse a razão da vida.
Resta-nos, em primeiro lugar,
reavaliar sempre. Pois, remontando no tempo, Montaigne já
revelava que "o crime nivela os cúmplices",
quando os tais sequiosos de glória ainda não satisfeitos,
atiram-se como "quem não a tem ainda, procura alcançá-la
a qualquer preço".
Noutra observação,
Hobbes também chegou ao ponto de mencionar que o homem
é mau e corrupto, justificando que "a competição
pela riqueza, a honra, o mundo e outros poderes leva à
luta, à inimizade e à guerra, porque o caminho
seguido pelo competidor para realizar seu desejo consiste em
matar, subjugar ou repelir o outro". Arrematando: "(...)
onde não há propriedade não pode haver
injustiça". Isso reiterado por Locke: "não
haveria afronta se não houvesse a propriedade".
É o que nos deixa por conclusão a "História
da Riqueza do Homem", de Leo Huberman.
Não menos relevante foi
Rousseau admitir que a capacidade humana chega ao cúmulo
de auto-destruir-se, porque "só o homem é
suscetível de tornar-se imbecil (...) a ambição
devoradora, o ardor de elevar sua fortuna relativa, menos por
verdadeira necessidade do que para colocar-se acima dos outros,
inspira a todos os homens uma negra tendência a prejudicar-se
mutuamente".
E Bergson, ao testemunhar os
horrores da primeira guerra mundial, percebeu: "Hecatombes
inauditas, precedidas dos piores suplícios, houveram
ordenadas com inteiro sangue-frio (...) é curioso ver
como os sofrimentos da guerra se esquecera depressa durante
a paz (...) só que a guerra é feita com as armas
forjadas por nossa civilização e o morticínio
é um horror que os antigos não poderiam jamais
imaginar". As armas... as armas.
Em Camus encontramos que "a
vida vale a morte; o homem é a madeira da qual se fazem
as fogueiras... (...) A própria guerra tem suas virtudes
(...) porque existem imbecis desenfreados, que matam por dinheiro
ou por honra (...) Ninguém pode ser feliz, sem fazer
mal aos outros. É a justiça desta terra".
É. Lamentavelmente é
quando passamos a entender a idéia de Edgar Morin ao
afirmar que ainda estamos na idade da pedra do conhecimento.
E isso nos faz prever o pior, o de que, na saga humana, o homem
nunca se libertara da barbárie, essa a razão de
estarem sempre no centro dos conflitos, das hostilidades, dos
antagonismos, das perversidades, da violência levada a
extremos.
Resta-nos, de verdade, a dor
da amargura e o repúdio à indiferença sobre
o sangue derramado e os escombros de um verdadeiro assassinato
do planeta, valendo-nos, ainda que tarde, da esperança,
se bem que longínqua mas, com certeza, factível,
de apostar na solidariedade humana e na emancipação
do homem no direito de viver e deixar viver para a construção
de um mundo melhor.
O medo causado pela inteligência
Enviado por Carmen Molina,
Belo Horizonte-MG
Por
José Alberto Gueiros
Fonte: Jornal da Bahia
23 setembro, 2009
Quando Winston Churchill, ainda
jovem, acabou de pronunciar seu discurso de estréia na
Câmara dos Comuns, foi perguntar a um velho parlamentar,
amigo de seu pai, o que tinha achado do seu primeiro desempenho
naquela assembléia de vedetes políticas. O velho
pôs a mão no ombro de Churchill e disse, em tom
paternal:
" Meu jovem, você
cometeu um grande erro. Foi muito brilhante neste seu primeiro
discurso na Casa. Isso é imperdoável. Devia ter
começado um pouco mais na sombra. Devia ter gaguejado
um pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje, deve
ter conquistado, no mínimo, uns trinta inimigos. O talento
"assusta."
E ali estava uma das melhores
lições de abismo que um velho sábio pode
dar ao pupilo que se inicia numa carreira difícil. A
maior parte das pessoas encasteladas em posições
políticas é medíocre e tem um indisfarçável
medo da inteligência. Isso
na Inglaterra. Imaginem aqui no Brasil. Não é
demais lembrar a famosa trova de Ruy Barbosa:
"Há tantos burros
mandando em homens de inteligência que às vezes
fico pensando que a burrice é uma ciência".
Temos de admitir que, de um modo
geral, os medíocres são mais obstinados na conquista
de posições. Sabem ocupar os espaços vazios
deixados pelos talentosos displicentes que não revelam
o apetite do poder. Mas é preciso considerar que esses
medíocres ladinos, oportunistas e ambiciosos, têm
o hábito de salvaguardar suas posições
conquistadas com verdadeiras muralhas de granito por onde talentosos
não conseguem passar. Em todas as áreas encontramos
dessas fortalezas estabelecidas, as panelinhas do arrivismo,
inexpugnáveis às legiões dos lúcidos.
Dentro desse raciocínio,
que poderia ser uma extensão do "Elogio da Loucura"
de Erasmo de Roterdan, somos forçados a admitir que uma
pessoa precisa fingir de burra se quiser vencer na vida. É
pecado fazer sombra a alguém até numa conversa
social. Assim como um grupo de senhoras burguesas bem casadas
boicota automaticamente a entrada de uma jovem mulher bonita
no seu círculo de convivência, por medo de perder
seus maridos, também os encastelados medíocres
se fecham como ostras à simples aparição
de um talentoso jovem que os possa ameaçar.
Eles conhecem bem suas limitações,
sabem como lhes custa desempenhar tarefas que os mais dotados
realizam com uma perna nas costas, enfim, na medida em que admiram
a facilidade com que os mais lúcidos resolvem problemas,
os medíocres os repudiam para se defender. É um
paradoxo angustiante.
Infelizmente temos de viver segundo
essas regras absurdas que transformam a inteligência numa
espécie de desvantagem perante a vida. Como
é sábio o velho conselho de Nelson Rodrigues:
"Finge-te de idiota e terás
o céu e a terra".
O problema é que os inteligentes
gostam de brilhar, que Deus os proteja.
Um herói de araque
Enviado por Luiz Carlos de O. Arantes
Por Augusto Nunes
7 agosto, 2005
Na fictícia Metrópolis, o Super-Homem se finge
de americano comum para disfarçar os superpoderes que
tem. Na inverossímil Brasília, um brasileiro comum
José Dirceu de Oliveira, mineiro de Passa Quatro
disfarçou-se de super-homem para simular superpoderes
inexistentes e comandar o assalto ao aparelho estatal. Tenho
uma biografia a preservar, declamou na abertura do depoimento
à Comissão de Ética da Câmara. É
a biografia de um herói de araque.
O líder estudantil dos
anos 60 tinha muito carisma e pouco juízo. A cada noite,
trocava de apartamento para esconder-se dos órgãos
de repressão e dormir em paz com as namoradas. Uma delas
foi Heloísa Helena, ou Maçã Dourada,
espiã a serviço da polícia política.
Os perdigueiros da ditatura poderiam ter capturado Dirceu sem
arrombar a porta: a namorada cuidaria de abri-la.
Algum defeito de fabricação
sempre induziu Dirceu a meter-se em tudo (e sobre tudo deliberar).
Aos olhos míopes dos devotos, a falha virou virtude:
ali estava um grande organizador, capaz de resolver simultaneamente
problemas distintos. O homem perfeito para organizar o congresso
anual da UNE. Dirceu resolveu que centenas de militantes esquerdistas
se reuniriam na diminuta Ibiúna, perto de São
Paulo. Até os cegos do lugarejo enxergaram a procissão
de forasteiros. Faltou pão, sobrou chuva. Todos acabaram
na cadeia.
Deixou a cela a bordo da lista
de presos libertados por exigência dos seqüestradores
do embaixador americano Charles Elbrick. Do grupo de libertadores
fez parte o jornalista Fernando Gabeira, hoje deputado federal.
Eleito pelo PT, transferiu-se para o Partido Verde com um argumento
singelo: Há limite para tudo. A arrogância
de Dirceu, decidido a humilhar o antigo parceiro, ultrapassara
todos os limites.
Em 1969, Dirceu pudera trocar
a cadeia pelos bistrôs de Paris. Gabeira mergulhou na
clandestinidade e na resistência armada. Lutou no Brasil
até ser capturado, submetido a torturas ferozes e condenado
à prisão. Há semanas, no discurso de regresso
à planície, Dirceu iluminou a biografia com momentos
de audácia que nunca existiram. Furtou-os do currículo
de Gabeira.
Enfrentei a ditadura de
armas na mão, proclamou. Onde e quando, companheiro?
Na França, empunhou apenas taças de vinho. Revólveres
e fuzis, só em Cuba, a escala seguinte. Matriculado num
cursinho para guerrilheiros, aí sim o aprendiz de codinome
Daniel mandou bala. Fulminou muitos inimigos. Todos
imaginários.
Voltou ao Brasil nos 70, pronto
para trocar chumbo no campo. Acabou trocando alianças
na cidade: usando o vistoso nome de guerra Carlos Henrique
Gouveia de Mello casou-se com a moça mais bonita
de Cruzeiro do Oeste, no interior do Paraná. Virou comerciante
e entrincheirou-se por cinco anos no balcão do Magazine
do Homem. Batalhou só em mesas de sinuca. Quando a anistia
foi decretada, abandonou a frente de combate, a mulher e o filho.
Filiado ao PT, não demorou
a tornar-se dirigente. Ajudou a empurrar para o acostamento
os operários fundadores. Reservou a estrada principal
a amigos e lacaios. A turma do Zé assumiu
o controle do PT. Não foi difícil ao comandante
impor aos militantes a política de alianças
bom eufemismo para suruba partidária. Inimigos
históricos viraram amigos de infância. Celerados
uterinos se tornaram pais da Pátria. O essencial era
garantir a vitória de Lula. E os fins, para Dirceu, sempre
justificaram os meios.
Lula vitorioso, o articulador
da campanha achou acanhado demais o espaço reservado
ao chefe da Casa Civil. Promoveu-se a superministro, monitorou
a montagem do primeiro escalão e, donatário ciumento
da capitania, vigiou o preenchimento dos milhares de cargos
de confiança. Fatias notáveis abrandaram a gula
de parceiros com medonhos prontuários. Os cargos restantes
foram suficientes para assegurar o sucesso do programa Desemprego
Zero no PT.
Como Lula resolveu ser presidente
sem presidir prefere viagens, palanques e improvisos
, encarregou o Amigo Zé de cuidar da casa. Nomeado
capitão do time do Planalto, Dirceu mandou e desmandou
até a explosão do escândalo protagonizado
por Waldomiro Diniz, amigo, assessor e extorsionário.
O país descobriu que o herói de Passa Quatro não
sabia nem mesmo escolher ajudantes diretos. Os rasgos na fantasia
se ampliaram com as manobras cafajestes da base aliada.
E a camuflagem ficou em frangalhos com o escândalo do
mensalão.
No depoimento ao Conselho de
Ética da Câmara, Dirceu tentou novamente disfarçar-se
de super-homem. Não funcionou. A platéia inteira
já sabe que o (ainda) deputado tem tantos poderes quanto
um Clark Kent sob o efeito da kriptonita.
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"Tereza da praia", de Tom Jobim e Billy Blanco
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