Os 40 anos do assassinato
de John Fitzgerald Kennedy

Pesquisa de textos e fotos na Internet por Isolda Harris, Dallas-Texas

Por Alberto Dines

Fonte: JB On line, 15 novembro, 2003

Os 40 anos do assassinato de John Fitzgerald Kennedy (que serão lembrados no próximo sábado) trazem de volta os valores que a sociedade americana tanto preza e, desde a eleição de George W. Bush, parecem soterrados. Galhardia, elegância intelectual, retórica, charme, bandeiras sociais e direitos humanos estão sendo evocados por novos livros, seriados de TV e, sobretudo, pela marca dos Kennedy: a tragédia

NOVA YORK - O pesadelo do Iraque fica cada dia mais penoso e o passado comparece como consolo. No feriado da última terça, Veterans Day, o país celebrou os heróis das outras guerras e por um dia se esqueceu desta. Na próxima semana, vai reencontrar-se com um de seus mitos preferidos.

Como na Antiguidade, a presença dos fados
-mesmo através de intervenções fatais- confere aos seus eleitos uma aura que costuma ser negada àqueles que apenas dispõem de poder e nenhuma atenção dos deuses.

 

Kennedy chega ao aeroporto de Dallas-Texas,
em 22 de novembro de 1964

A diferença com os Bush não é apenas partidária, ideológica, cultural ou religiosa. O clã do Texas é o artífice da brutalidade, enquanto o de Massachussets tem sido sua vítima preferencial. Isso faz diferença. George W. Bush é o filho de um político milionário, empurrado no tapa e aos trambolhões para aproveitar as vantagens oferecidas pelo pai. John Kennedy também teve pai rico, poderoso, ambicioso, mas a morte prematura do irmão primogênito (cuidadosamente preparado para a Presidência) ofereceu-lhe os desafios para forjar sua fibra e, sobretudo, sua força moral. O livro que escreveu quando preparava sua candidatura (Profiles in Courage, coletânea de biografias premiada com o Pulitzer) dá uma idéia do tipo de coragem que buscava. Em Dallas, Texas, juntam-se as duas trajetórias.


Kennedy em desfile aberto.
Seus assessores haviam lhe aconselhado veículo fechado
  Os espelhos usados por Plutarco em Vidas Paralelas para comparar lideranças gregas e romanas poderiam produzir fascinantes avaliações se aplicados no confronto entre os Bush e os Kennedy. Mesmo com as prosaicas ferramentas fornecidas pelo noticiário cotidiano vislumbram-se discrepâncias transcendentais. A principal delas é a recorrência da mentira.

Kennedy também embarcou em desastrosas aventuras (a tentativa de invasão de Cuba e a ampliação da intervenção no Vietnã são algumas delas). Foram assumidas com clareza, sem recorrer a logros. O 11 de Setembro não pôde ser disfarçado e foi escancarado em suas catastróficas dimensões, mas seus desdobramentos estão sendo manipulados pelo grupo Bush de forma primária, quase estúpida. A começar pelo pretexto para a incursão punitiva no Iraque. Tanto se trapaceou para justificar a invasão que, agora, quando a Casa Branca finalmente anuncia sua estratégia de evitar novos Saddams, convertendo o Oriente Médio num bastião da democracia, ninguém a levou a sério.

O conservador William Safire, há dias, chegou a reclamar do descaso da mídia para essa peça oratória que tinha a pretensão de equiparar-se aos famosos 14 Pontos com os quais Woodrow Wilson justificou a entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial. Proclamada há meio ano, poderia ser vista como bandeira para uma política duradoura. Produzida às pressas, em meio à enxurrada de disparates diários, amesquinhou-se. Virou farsa. Também aqui há marqueteiros que defendem a escola Cantinflas - falar muito, sempre, mesmo que ninguém recorde o que foi dito.

A chamada ética protestante criou na sociedade americana o mito da busca da verdade, mentir não é apenas infração moral, é crime. Porém, sob a égide do fundamentalismo e da arrogância, transformou-se numa sucessão de embustes. Nas livrarias estão algumas provas: pelo menos três best-sellers tratam das mentiras de Bush (*).  
Texas School Book Depository,
de onde Lee Oswald desfechou o tiro mortal

A Nova Fronteira de Kennedy foi mais do que um conjunto de programas, era uma causa, visão de mundo idealista, antecipada no memorável discurso de posse. Já esta improvisada apresentação da ''Era da Liberdade'' não passa de um estratagema -mais um- sem chance de empolgar, inclusive, os países da coalizão. Fantasia libertária, formal, que passa ao largo do presídio de Guantánamo, da nova doutrina e dos novos procedimentos de segurança nacional.

   

Dealey Plaza, o palco do assassino
   

Momentos do disparo mortal



 

A mensagem kennediana, ainda que no contexto da Guerra Fria, pretendia converter-se num apelo cívico, convocação da sociedade mundial para grandes empreitadas. O hino bushista, executado algumas oitavas abaixo, é pura patriotada para consumo daqueles que confundem poder com grandeza.

O exercício da política admite eufemismos, recursos retóricos e doses de cosmética, mas abomina a mentira. Sobretudo quando flagrante e flagrada. Kennedy foi executado em Dallas porque sabiam que cumpriria suas promessas. Bush poderá ser reeleito porque há muita gente que precisa de suas trapaças.

(*) Lançamentos recentes sobre as mentiras de Bush:
The Lies of George W. Bush, de David Corn,
Lies and the Lying Liars Who Tell Them, de Al Franken,
Big Lies: The Right-Wing Propaganda Machine and How it Distorts

Galeria de fotos
www.jfklancer.com
www.celebritymorgue.com


Música de fundo em arquivo MIDI (experimental):
"Sanfona
", de Egberto Gismonte
Seqüência Midi:
Egberto Gismonte
Nota para a seqüencia Midi: *****

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Belo Horizonte, 20 novembro, 2003

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