Português
em crônica
Enviado por Joni Lopes, Rio de Janeiro-Capital
Autoria
desconhecida
20 maio, 2005
Era a terceira vez que aquele
substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador. Um substantivo
masculino, com um aspecto plural, com alguns anos bem vividos
pelas preposições da vida. E o artigo era bem
definido, feminino singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso
predicado nominal. Era ingênua, silábica, um pouco
átona, até ao contrário dele: um sujeito
oculto, com todos os vícios de linguagem, fanático
por leituras e filmes ortográficos. O substantivo gostou
dessa situação: os dois sozinhos, num lugar sem
ninguém ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade,
começou a se insinuar, a perguntar, a conversar.
O artigo feminino deixou as reticências
de lado, e permitiu esse pequeno índice. De repente,
o elevador pára, só com os dois lá dentro:
ótimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para
provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, já
estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeça
a se movimentar: só que em vez de descer, sobe e pára
justamente no andar do substantivo. Ele usou de toda a sua flexão
verbal, e entrou com ela em seu aposto. Ligou o fonema, e ficaram
alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética
clássica, bem suave e gostosa. Prepararam uma sintaxe
dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando,
sentados num vocativo quando ele começou outra vez a
se insinuar.
Ela foi deixando, ele foi usando
seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo,
todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo
direto. Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário,
e ele sentindo seu ditongo crescente: se abraçaram, numa
pontuação tão minúscula, que nem
um período simples passaria entre os dois. Estavam nessa
ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula
ele não perdeu o ritmo e sugeriu uma ou outra soletrada
em seu apóstrofo. É claro que ela se deixou levar
por essas palavras, estava totalmente oxítona às
vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros. Ela
totalmente voz passiva, ele voz ativa.
Entre beijos, carícias,
parônimos e substantivos, ele foi avançando cada
vez mais: ficaram uns minutos nessa próclise, e ele,
com todo o seu predicativo do objeto, ia tomando conta. Estavam
na posição de primeira e segunda pessoas do singular,
ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono,
sentindo o pronome do seu grande travessão forçando
aquele hífen ainda singular. Nisso a porta abriu repentinamente.
Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido
tudo, e entrou dando conjunções e adjetivos nos
dois, quese encolheram gramaticalmente, cheios de preposições,
locuções e exclamativas.
Mas ao ver aquele corpo jovem,
numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica,
o verbo auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o
seu particípio na história. Os dois se olharam,
e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo
o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou, e mostrou
o seu adjunto adnominal. Que loucura, minha gente. Aquilo não
era nem comparativo: era um superlativo absoluto. Foi se aproximando
dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo
do sujeito apontado para seus objetos. Foi chegando cada vez
mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo,
propondo claramente uma mesóclise-a-trois.
Só que as condições eram estas: enquanto
abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do
substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo
feminino. O substantivo, vendo que poderia se transformar num
artigo indefinido depois dessa, pensando em seu infinitivo,
resolveu colocar um ponto final na história:agarrou o
verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou-o pela janela e voltou
ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa,
com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa
conclusiva.
Beijo que te quero mais!
Enviado por Lúcia Assis, Belo Horizonte-MG
Por
Rosana Braga, jornalista, escritora, coordenadora de projetos
editoriais e consultora em comportamento humano
16 maio, 2005
Beijo deveria ser moeda de pedágio.
Passar pela porta de casa seria proibido sem antes lascar um
beijo na mãe, no pai, no irmão, no filho, no marido
e, para quem gosta, até no cachorro!
Beijo deveria ser como bolinha
de sabão. Num sopro, a gente poderia mandar alguns pelos
ares, que explodiriam na pele de quem neles encostassem. E de
repente, sem saber de onde veio, seríamos presenteados
com um beijinho perdido pelas ruas da cidade...
Beijo deveria ser elemento químico.
Constar na Tabela de Elementos que a gente tem de decorar para
a prova de química, no colégio. Assim, certamente
seria mais interessante e ainda ensinaria qual a fórmula
mágica deste estalo tão bom...
Beijo deveria caber num envelope,
mesmo que fosse dos maiores, mas que pudéssemos enviá-lo
pelo correio, para aquela pessoa que está tão
longe e que daria qualquer coisa para sentir o gosto da boca
de seu amado.
Beijo deveria acender luzes pelo
corpo da gente. E quando a energia elétrica entrasse
em pane, bastaria que demonstrássemos nosso amor pelas
pessoas queridas e qualquer escuridão terminaria...
Beijo deveria estar disponível
nas vitrines das melhores docerias. Poderia até ter preço
especial, mas que pudessem pagar por ele aqueles que aparentemente
menos merecessem, porque beijos são realmente transformadores
e certamente provocariam reações sensacionais.
Mas beijo não é
assim. É particular e a gente escolhe em quem quer dar.
Porque beijo é um presente que precisa de vontade para
ser oferecido. E talvez seja melhor que assim seja: não
tão anônimo, não tão sem motivo,
nunca forçado, ainda que possa ser pedido.
Por fim, é essencial que
o beijo seja leve, fluido, sintonizado com a delicadeza própria
de quem sabe dar. Na verdade, beijo é sempre dado. Receber
é apenas contingência da mais gostosa e prazerosa
troca entre duas pessoas que se desejam insanas por alguns instantes,
posto que um beijo pode valer mais que a lucidez de uma vida
inteira.
Fim de baile na casa do Aristides
Enviado pelo autor, Belo Horizonte-MG
Por
Ivani Cunha, jornalista
8 maio, 2005
Nada se perde. Rascunhei este
texto no verso de algumas folhas com histórias de garimpos
da Amazônia. Decidi reutilizar o papel com textos que
me dão prazer, e tenho a sensação de que
assim diminui um pouco o prejuízo que eu tive ao assumir
a revisão do tal livro. O autor, um ex-líder de
garimpeiros e atualmente próspero empresário da
educação no interior de Minas Gerais, pagou com
atraso a metade do trabalho. Alegou que havia combinado uma
revisão "mais ampla" (talvez esperasse que
este revisor reescrevesse toda a obra), deu mais uma desculpa
qualquer e... não quitou o resto.
Ficou nisso e eu não insisti, mas a revolta emerge quando
vejo os textos com minhas correções. Melhor tentar
esquecer, porque agora eu sei que estava lidando com gente perigosa:
tive a oportunidade de conhecer bastante o ex-garimpeiro por
meio das histórias que ele mesmo contou...
Melhor concentrar a atenção na lembrança
de tempos e pessoas que me deram prazer. Por exemplo, os anos
50 e a gente da Vila Nova Esperança, região Nordeste
de Belo Horizonte. Andava-se descalço ou usava-se tamanco
de madeira, mas de uma forma ou de outra a pessoa estava exposta
aos escorpiões de agosto, que na minha casa fizeram uma
vítima fatal.
A vida na Nova Esperança era calma e seria tediosa se
não tivéssemos um vizinho chamado Aristides, o
Aristides da Margarida - era assim que as pessoas se referiam
aos casais na Belo Horizonte da periferia, onde se reproduziam
os costumes do interior mineiro. Podia ser também a Margarida
do Aristides, mas é dele, o "Tide", que estou
falando, sem desmerecer nem um pouco a mulher.
Éramos vizinhos divididos por uma cerca de arame farpado,
que em certas épocas se cobria de ora-pro-nóbis
e, em outras, de incontroláveis trepadeiras selvagens.
Muros eram dispensáveis naquele tempo. Mas eu acho que
às vezes o Aristides preferia que, em vez da cerca, houvesse
entre os dois lotes um bom muro, fácil de escalar. Ele
devia pensar assim nas madrugadas em que era obrigado a fugir
da própria casa, sob a ameaça de um convidado
pé-de-valsa sob efeito do álcool.
Alguns bailes na casa do Aristides por pouco não se transformavam
em tragédia,
e nosso incorrigível vizinho promovia pelo menos um arrasta-pé
por mês. À noitinha começavam a chegar os
casais: as mulheres com os cabelos armados, saias rodadas e
boleros bem justos, algumas com uma pinta na face ou no queixo,
que era moda; seus acompanhantes, todos de paletó e gravata,
alguns caprichando no linho, podiam pentear os cabelos mirando-se
nos bem lustrados sapatos de bico fino.
Essa parte da vila ainda não desfrutava o conforto da
energia elétrica, mas sempre havia um grupo de músicos
para animar os bailes do Tide, que também dominava o
seu instrumento, um reluzente trombone de vara. À luz
de lampiões e lamparinas, e irrigados por boa cana e
outras bebidas fortes, os casais deslizavam sobre o piso de
tijolo areado ao som de boleros, tangos, foxtrotes, rumbas,
sambas-canções e outros ritmos.
Ficávamos lá em casa à espera do grito
do Aristides: "Padrinho, me acode que vão me matar."
Meu pai, padrinho de casamento dele, ia até à
porta da cozinha para esperá-lo ou corria ao quintal
para ajudá-lo a pular a cerca. Depois escondia o afilhado
e lhe passava o sermão de sempre: "Aristides, tenha
juízo, um dia você não vai conseguir fugir
para cá. Pense nisso. Você tem mulher e filho.
Olhe que a bebida só traz complicação...".
Antes do amanhecer, os convidados se despediam, e durante algum
tempo ainda se ouviam, bem longe, as notas de uma flauta, quem
sabe executadas por um dos músicos que passaram a madrugada
tocando. Aristides prometia que no próximo baile seria
diferente, com bebida sob controle e nada de briga. Ninguém
acreditava.
Algumas horas depois o homem estava bem disposto outra vez,
ensaiando alguns acordes no trombone ou treinando no terreiro,
em frente da casa, uns perdigueiros para ajudá-lo nas
caçadas ou render-lhe alguns trocados.
Mas a calma na vila não
duraria muito. À tardinha, o canto das cigarras era quebrado
pelo tropel de um cavalo. A poeira vermelha escondia o cavaleiro,
sempre ele, o Tide, montado no animal em pêlo. Estava
novamente alterado pelo álcool, que fora servido de má
vontade no bar do Benedito Antão ou no armazém
do Antônio Melgaço, que conheciam bem o freguês.
O cavalo galopa pela rua esburacada, enquanto o cavaleiro grita,
bate os calcanhares na barriga do animal, balança, escorrega
até quase o pescoço do bicho, mas não cai.
As mães recolhem os filhos, e a minha diz para a amiga
que a visita: "Tide é boa pessoa, não devia
beber. Tenho pena da Margarida...".
Aristides era um bom sujeito de verdade. Cometia suas pequenas
transgressões e gostava de se arriscar um pouco quando
encorajado por algumas doses de álcool, mas viveu muitos
anos depois de cometer essas loucuras. Com seus bailes, os perdigueiros
e as exibições de cavaleiro pela esburacada rua
Dália, atual Rua Margarida Prachedes, divertia as pessoas
e ajudava a empurrar o tempo naquela época em que o mundo
era pouco maior do que os nossos quintais.
Mas eu falava, no início desta crônica, de um garimpeiro
que me pagou apenas a metade do combinado pela revisão
de suas histórias. Que o diabo o carregue!
Orgasmo trifásico
Diana Morais Rego, Montes Claros- MG
Autoria desconhecida
24 março, 2004
Orgasmo feminino é coisa da qual as mulheres entendem
muito pouco e os homens...muito menos. Pelo fato de ser uma
reação endócrina que se dá sem expelir
nada, não apresenta nenhuma prova evidente de que aconteceu
ou se foi simulado. Orgasmo masculino não! É aquela
coisa que todo mundo vê. Deixa o maior flagrante por onde
passa. Diante desse mistério, as investigações
continuam e muitas pesquisas são feitas e centenas de
livros escritos para esclarecer este gostoso e excitante assunto.
Acompanho de perto, aliás, juntinho, este latejante tema.
Vi, outro dia, no programa do
Jô Soares, uma sexóloga sergipana dando uma entrevista
sobre orgasmo feminino. A mulher, que mais parecia a gerente
comercial da Walita, falava do corpo como quem apresenta o desempenho
de uma nova cafeteira doméstica. Apresentou uma pesquisa
que foi feita nos Estados Unidos para medir a descarga elétrica
emitida pela "piriquita" na hora do orgasmo, e chegou
à incrível conclusão de que, na hora "H",
a "perseguida" dispara uma descarga de 250 mil microvolts.
Ou seja, cinco "pererecas" juntas ligadas na hora
do "ai meu Deus!!!..." seriam suficientes para acender
uma lâmpada. Uma dúzia, então, é
capaz de dar partida num Fusca com a bateria arriada.
Uma amiga me contou que está
treinando para carregar a bateria do telefone celular. Disse
que gozou e, tcham, carregou. É preciso ter cuidado porque
isso não é mais "xibiu", é torradeira
elétrica! E se der um curto circuito na hora de "virar
o zoinho", além de vesgo, a gente sai com mal de
Parkinson e com a lingüicinha torrada. Pensei: camisinha
agora é pouco, tem de mandar encapar na Pirelli ou enrolar
com fita isolante. E na hora "H", não tire
o tênis nem pise no chão molhado... Pode ser pior!!!...
É recomendável, meu amigo, na hora que você
for molhar o seu "biscoito" lá na canequinha
de sua namorada, perguntar: é 110 ou 220 volts? Se não,
meu xará, depois do que essa moça falou lá
no Jô, pode dar "ovo frito no café da manhã".
Esse país não melhora por absoluta falta de criatividade...
São as mulheres, a solução contra o apagão.
OBS: É por isso que às
vezes elas querem aterrar!!!...
Edição
anterior
Música
de fundo em arquivo MID (experimental):
"Feito de oracao", de Noel Rosa e Vadico
Seqüência Midi: Hiram Araújo Filho
Nota para a seqüência MIDI: *****
Inspire-se.
Faça sua crônica

|
Segundo
o Aurélio, crônica é "a narração
histórica ou registro de fatos comuns, feitos por
ordem cronológica. Genealogia de família
nobre. Pequeno conto de enredo indeterminado".
No jornalismo é redigido de forma livre e pessoal,
e tem como temas fatos ou idéias da atualidade,
de teor artístico, político, esportivo etc.,
ou simplesmente relativos à vida cotidiana.
É também uma seção ou coluna
de revista ou de jornal consagrada a um assunto especializado.
O conjunto das notícias ou rumores relativos a
determinados assuntos.
Portanto,
faça a sua crônica.
Envie para
o
Jornal
dos Amigos.
|
Participe
do Jornal
dos Amigos, cada
vez mais um jornal cidadão
O Jornal dos
Amigos agradece a seus colaboradores e incentiva os leitores
a enviarem textos, fotos ou ilustrações com sugestões
de idéias, artigos, poesias, crônicas, amenidades,
anedotas, receitas culinárias, casos interessantes, qualquer
coisa que possa interessar seus amigos. Escreva para o e-mail:

Se
o conteúdo estiver de acordo com a linha editorial do
jornal, será publicado.
Não esqueça de citar seu nome, a cidade de origem
e a fonte da informação.
Solicitamos
a nossos colaboradores que, ao enviarem seus textos, retirem
as "flechas", isto é, limpem os textos daquelas
"sujeiras" de reenvio do e-mail. Isso facilita bastante
para nós na edição.
Início
da página
www.jornaldosamigos.com.br