Lavoura transgênica se espalha com o vento
Enviado por Anderson Porto, Niterói-RJ

Cientistas, produtores e indústria debatem perdas,
riscos e responsabilidades desta contaminação

Por Andrew Pollack/The New York Times

Fonte: O Estado de S.Paulo
4 outubro, 2004

NOVA YORK - Toivo Lahti cultiva mamão papaia no Havaí. Nos últimos anos, outros agricultores começaram a plantar árvores geneticamente modificadas. Mas ele continuou com as variedades convencionais. Na primavera, algumas de suas frutas tiveram resultado positivo no teste de transgenia. "Fiquei surpreso", disse Toivo. Ele derrubou suas 170 árvores e está replantando-as sem garantia de que o problema -o fato de o vento levar o pólen das árvores modificadas de outras fazendas para as suas- não ocorrerá de novo.

Dos papaias do Havaí ao milho do México e à canola no Canadá, a disseminação de pólen ou sementes de plantas transgênicas está deixando de ser uma preocupação científica abstrata. Agricultores de plantações orgânicas estão preocupados com a perda de vendas por causa da contaminação. Os ambientalistas se preocupam que os genes modificados possam escapar das plantações para as ervas daninhas.

Tais cuidados vieram à tona semana passada, quando a Environmental Protection Agency (órgão de controle ambiental dos EUA) informou que um tipo de agróstea rastejante modificada para resistir ao Roundup, popular herbicida, poderá polinizar grama convencional a 20 quilômetros, muito mais longe que os estudos indicaram. Isso despertou o temor de que o gene se espalhe para gramas selvagens, criando ervas daninhas imunes ao herbicida mais usado no mundo.

As plantações transgênicas parecem ter uma forma de aparecer onde não são desejadas. O milho StarLink, para ração animal, acabou em produtos de mercearia em 2000, o que resultou em recolhimento. Quantidades minúsculas de milho transgênico para fazer um produto farmacêutico penetraram na soja de Nebraska.

Diante desses incidentes, legisladores, Justiça e indústria começam a considerar garantir a coexistência ou determinar responsabilidades. Margaret Mellon, da União dos Cientistas Preocupados, disse que a responsabilidade "é um gigante adormecido pairando sobre o setor".

Mas a indústria de biotecnologia e alguns cientistas e advogados dizem que esse fluxo de genes, embora inevitável, não será grande problema de saúde, econômico ou jurídico. Para começar, dizem, os genes têm fluido naturalmente. "Uma vez que o fluxo de pólen tem acontecido o tempo todo, é preciso verificar se causou problemas no passado", disse Drew L. Kershen, professor de Direito da Universidade de Oklahoma. "A resposta é não."

Ele e outros citam o exemplo de dois parentes próximos: canola e colza. "Os dois podem polinizar uma à outra, mas com áreas de proteção entre elas podem ser plantadas com segurança sem se mesclarem", disse Kershen.

Mesmo que os genes modificados realmente fluam entre as plantas e daí?, dizem alguns cientistas. Uma preocupação freqüente é que um gene modificado para resistir a insetos, por exemplo, migre para uma parente erva daninha, gerando um super-erva. Já se conhece o caso de um gene resistente a herbicida que atravessou da canola para uma erva de mostarda selvagem no Canadá.

Mas o efeito de acrescentar um único gene a uma erva tende a ser mínimo se comparado com os efeitos da introdução de uma espécie num novo ambiente, segundo C. Neal Stewart Jr., da Universidade do Tennessee. Ele disse que, nas suas experiências, no cruzamento de canola transgênica com ervas daninhas, os brotos foram menos apropriados do que outras ervas porque com a resistência a insetos elas também herdaram outros genes da canola - que são bons para a vida protegida da lavoura, mas não para a vida dura de uma erva daninha. "O fluxo de genes não é essa força evolucionária que algumas pessoas acham que é."

Outra preocupação está relacionada ao fluxo de genes entre plantações para outra. Isso poderá criar problemas de saúde se, digamos, milho transgênico para produzir produtos farmacêuticos aparecer em flocos de milho.

Até agora, as características introduzidas nas lavouras têm sido principalmente a resistência a insetos ou herbicidas e não têm se mostrado prejudiciais. Ainda assim, alguns países e empresas não as aceitam, por causa de sua segurança não comprovada ou da rejeição do consumidor. Assim, os agricultores podem perder vendas com a contaminação.

Num levantamento de 2002 da Fundação de Pesquisa de Agricultura Orgânica, oito agricultores informaram ter perdido a certificação orgânica por causa do contato com plantações transgênicas e muitos mais disseram que tiveram de pagar para submeter suas plantações a testes.

Mas uma consultoria britânica concluiu este ano que agricultores orgânicos e biotecnológicos coexistem muito bem. O estudo, financiado em parte pela indústria de biotecnologia, descobriu que o plantio de milho ou soja orgânicos no Meio Oeste cresceu muito desde 1995, quando as lavouras transgênicas começaram.

Kershen diz que embora os padrões orgânicos não permitam aos agricultores usar plantas transgênicas, há espaço para acidentes. Uma cultura pode ser vendida como orgânica mesmo se traços de pesticida tenham chegado a ela vindos de outra fazenda. Da mesma forma, argumenta, agricultores orgânicos não devem perder a certificação se algum pólen biotecnológico for levado até sua plantação.

Bob Scowcroft, da fundação, disse que, embora isso possa ser verdade na teoria, as normas não são claras e alguns agricultores estão perdendo vendas ou certificação. Quem deve pagar por isso é um assunto em debate.


Estamos perdendo nossas hidrelétricas
e nosso patrimônio natural

Enviado pelo autor, Guaramirim-SC

Por Germano Woehl Jr., Instituto Rã-bugio
para Conservação da Biodiversidade
www.ra-bugio.org.br
Tel. (12) 3947-5424
E-mail: germano@ra-bugio.org.br

Não há dúvidas de que precisamos de energia elétrica para desenvolver o País, mas será que a única solução desse problema é a construção de novas hidrelétricas? Que tal nos preocuparmos um pouco em cuidar das hidrelétricas já implantadas? O que está deixando os empreendedores tão alucinados, querendo construir hidrelétricas de qualquer jeito, em qualquer lugar, passando por cima das leis ambientais? Seria a linha especial de financiamento público (com juros subsidiados) do BNDES? Neste caso, não seria mais racional algum tipo de incentivo para estimular a conservação da natureza para, assim, prolongar a vida útil das represas e aumentar a capacidade de geração das hidrelétricas já instaladas? Chegou a hora de calcularmos o valor real dos serviços prestados por uma natureza preservada, condição única para produção de água em abundância e de qualidade.

Boa parte das represas das hidrelétricas em operação está com problemas gravíssimos de assoreamento, causado pelo arraste de sedimentos em conseqüência da destruição da mata ciliar, que é rigorosamente protegida por lei, mas devido à fiscalização deficiente o problema tem atingido proporções preocupantes; desmatamentos também secam as nascentes (rebaixam o lençol freático) e provocam alterações climáticas, o que reduz drasticamente o volume de água nos rios; o aumento da poluição das águas (por sedimentos) também aumenta os custos de manutenção das turbinas, além da redução do tempo de vida útil. Então, não seria muito mais racional atacarmos estes problemas, que são relativamente simples?

A capacidade instalada das hidrelétricas no País é superior a 120 mil MW, mas a energia gerada é de apenas 72 mil MW. Alguém deveria explicar o porquê dessa discrepância. O que está faltando para atingirmos a capacidade instalada? Ou os números estariam superestimados?

É importante isso ser esclarecido para a sociedade porque as últimas áreas preservadas da já arrasada mata Atlântica, por exemplo, estão em jogo, correndo perigo por conta dos projetos de construção de hidrelétrica que pipocam por todos os lugares. Nem as belíssimas cachoeiras da serra do Mar escapam, com as chamadas pequenas centrais hidrelétricas (PCH), que consistem em desviar a água das cachoeiras por uma tubulação, aproveitando o desnível natural do lugar.

Um caso particularmente relevante é o projeto de uma PCH na serra do Mar (protegida pela Constituição Federal), em Corupá, SC, no rio da Bruaca. Este projeto, PCH- Bruaca, com financiamento do BNDES, promete gerar 2 MW, e vai desviar a água de uma cachoeira de 96 metros de altura, que tem um valor histórico para a população local e é a mais vistosa, o cartão postal da cidade. Mas os danos não param por aí: vão transpor rios e o desviar o rio Bruacas, secando seu leito por cerca de 3 km, com várias outras cachoeiras menores, trecho que corta uma área de mata Atlântica original (virgem).

Em Corupá, a natureza foi generosa, concentrando uma abundância impressionante de belezas naturais: rios com água cristalina, cachoeiras, paredões rochosos e montanhas, boa parte delas ainda recobertas com mata Atlântica original. Essa exuberância da paisagem da pequena Corupá, com 13 mil habitantes, começou a atrair turistas e, sem nenhum financiamento subsidiado do BNDES, investidores do setor. Começaram a surgir hotéis, pousadas, restaurantes e infra-estrutura nos locais a serem visitados, gerando muitos empregos. E o turismo de Corupá é de qualidade: só no ano passado uma operadora alemã mandou 90 turistas diretamente para lá; nas trilhas da RPPN “Parque Ecológico Emilio Battistella”, que tem 12 belas cachoeiras, o idioma mais comum de se ouvir é o inglês e alemão. Portanto, temos em Corupá um potencial extraordinário para desenvolver o turismo e, assim, gerar riquezas, contribuindo para diversificar a economia, que é estratégico para o País.

No entanto, a população de Corupá foi surpreendida há pouco mais de um mês quando o projeto PCH-Bruaca veio à tona. Tudo foi feito sob sigilo, e o projeto já estava até com as licenças ambientais, de instalação inclusive, concedidas pela Fundação do Meio Ambiental (FATMA), órgão estadual, mas acabaram sendo canceladas pelo próprio órgão devido às denúncias de irregularidades. Infelizmente, o que é óbvio para os habitantes de Corupá ou qualquer outra pessoa sensata deste País - de que vale mais o futuro promissor do ecoturismo do que os 2 MW da PCH – parece não ser para o órgão ambiental, que está se empenhando para conceder uma nova licença.

Os empreendedores são de fora. Parece até que a prospecção dessas cachoeiras é feita nos “folders” e anúncios das agências de turismo (o que, daqui em diante, pode levar muitos municípios a terem que esconder suas cachoeiras).Com certeza, perdemos muitas PCH-Bruaca´s todos os anos devido aos desmatamentos, sobretudo nas margens dos rios, que poderiam ser drasticamente reduzidos com ações simples de fiscalização; da mesma forma, as águas dos rios cada vez mais sujas aumentam também a freqüência de manutenção das turbinas (provocando desligamentos constantes) e reduzem seu tempo de vida útil; a contaminação biológica dos nossos rios, como o caso do mexilhão, também engolem várias PCH-Bruaca´s.

Campanhas para evitar o desperdiço de energia também poderiam ser implementadas, com isso, os especialistas estimam, poderíamos reduzir o consumo em até 20%, energia equivalente a milhares de PCH-Bruaca´s. Há ainda as fontes alternativas de energia limpa, bastante promissoras. Enfim, temos várias alternativas viáveis para resolver o problema da oferta de energia; o mesmo não acontecerá com a destruição do nosso valioso patrimônio natural, que deixará as gerações futuras sem alternativas.


Ideologização da Ecologia?
Enviado pelo autor, Florianópolis - SC

Stênio Ubirajara Calsado Vieira, arquiteto e professor
20 de outubro, 2004

Em contrapartida, será que estão, agora, tentando ideologizar a agricultura, ou o agronegócio? Está a Direita tentando impingir à Esquerda a responsabilidade sobre toda a ciência que não rende dinheiro? Que conspiração, heim? Mas, contradição, se foi Lula e jamais Fernando Henrique quem liberou o "grão sujo" no Brasil, será que então Fernando Henrique é que seria de esquerda e Lula de direita? E não esqueçam que o Ministro da Agricultura é o mesmo.

Discussão idiota. Ambos fazem apenas o que lhes é próprio, política. Detém, como é natural, pouco conhecimento técnico e são portadores de poucas convicções pessoais sobre a matéria. Na verdade, mudaram os interlocutores e as vozes que lhes chegam aos ouvidos e, nisto, Lula parece estar prejudicado na comparação, apesar de possuir um Ministério do Meio Ambiente aparentemente mais forte.

De um lado um Presidente frágil, dependendo de qualquer resultado econômico que resgate seu governo da mediocridade da ausência de projetos e resultados. De outro, um ex-Presidente politicamente mais "orgânico" que não se permitia prisioneiro do lobby medíocre das FARSUL da vida, essa federação gaúcha dominada por agro-produtores contrabandistas e contraventores que não economizam denúncias e mobilizações contra a alegada contravenção e crime cometidos pelos “agentes” ideologizados do MST, pressionando e defendendo, então, no caso, por legalidade e rigor na ação governamental.

Por que teria sido Fernando Henrique poupado de tantas críticas e pressões contra seu Ministério do Meio Ambiente, como ocorre com Lula? Existe alguma razão mais sólida que o compartilhamento de fronteiras (RS - Argentina) para justificar o contrabando maciço do grão sujo? Não teria sido a proibição da soja transgênica no governo petista do RS o motivo maior da sua disseminação "ideológica" naquele Estado, durante o governo FHC? Afinal, em Santa Catarina e no Paraná a presença dela ainda é irrisória ou proibida, como neste último, apesar dos esforços da propaganda financiada pelas Monsanto ou pelos que querem fazer crer, a todo custo, que tecnologia é, sempre, ciência e progresso.

Pois o RS da FARSUL produz apenas 11% da soja brasileira (sendo transgênica 90% da produção gaúcha), conseqüência do contrabando de grãos da Argentina que faz duo com os Estados Unidos na defesa do grão sujo. Mas o mesmo RS possui indústrias de processamento da soja para consumo humano onde, convenientemente, é destacado na embalagem "produzido com soja não transgênica", do contrário a soja suja não chegaria na minha mesa, nem na sua mesa. Os grandes mercados externos, exceto a China (ainda), se protegem com relação aos efeitos maléficos que a ciência ainda não especificou, talvez pela ausência dos indispensáveis investimentos em pesquisa de grandes grupos econômicos, ou de entidades públicas governamentais suficientemente zelosas por este mundo afora, excluídos os EUA e a Argentina, é claro.

Mas quem lê ou acessa a imprensa gaúcha não pode imaginar que lá é a terra que consagrou a luta de Lutzenberger. A poderosa FARSUL parece demonstrar controle de todas as colunas e páginas econômicas e políticas, afirmando o indemonstrável, ou seja, que a soja brasileira ou o agronegócio brasileiro necessita dessa poluição viva ou dessa degradação genética para produzir os resultados que aí estão, nos quais são marginais, apenas.

Orgânica, a recomendável, ou convencional, com seus custos ambientais elevados nunca contabilizados, a soja brasileira progrediu e progride acessando mercados criteriosos como o das nossas mesas, correspondendo aos nossos temores e nossas precauções. Ou mercados menos criteriosos, cuja ignorância e desinformação tornam irrelevantes suas naturezas (ainda).

Ecologia também é ciência e, por sinal das mais modernas e avançadas, tão moderna que a tecnologia dela derivada é ainda incipiente e, portanto, geradora de resultados econômicos estatisticamente pouco significativos e pouco significantes.

Este é o nó da questão. Ciência contra Tecnologia. A Ciência, precursora tradicional de novos métodos, nova consciência social e nova filosofia, precisa de proteção, e principalmente compreensão, das mais responsáveis instituições públicas e privadas quando sua filha, a Tecnologia, no cumprimento de seu papel econômico (o EUA, onde impera, que o diga), exerce o atropelamento cego na direção de seus objetivos naturais, o lucro puro e simples, local ou exercício este onde a reflexão só costuma significar estagnação e atraso (não por acaso palavras estas comuns ao linguajar dos porta-vozes da mesma FARSUL, em todos os ambientes).

Ecologia não é Ideologia. Agronegócio não é Partido Político. E Transgenia é assunto para ser debatido livremente, e refletido, nos meios de comunicação, junto à opinião pública, acelerando, assim, sua digestão no meio social e cultural brasileiro e internacional.

Não é pedir muito, é?


Música de fundo em arquivo MIDI (experimental):
"Allegro", de Mozar
Nota para a seqüência MIDI: *****

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Belo Horizonte, 25 fevereiro, 2005

Artigo Verde