O muro americano

O jornalista Carlos Alberto de Azevedo percorreu 3.140 km da fronteira Estados Unidos-México em 1997 para ver os limites da globalização. O texto resultante, sob a forma de narrativa dos fatos, é leitura obrigatória para o estudante de jornalismo. A edição original, publicada em uma única página na Web, foi desdobrada em sete páginas para uma leitura atenta e agradável

Pesquisa do tema "emigração" por Isolda Harris, Dallas-Texas

Reportagem realizada em 1997 pela "Oficina da Informação"
Reportagem e fotos: Carlos Alberto de Azevedo
Editor: Raimundo Rodrigues Pereira
Reedição de textos e tratamento de imagens: Roberto Bendia

Conhecendo os limites da globalização

Por Raimundo Rodrigues Pereira

Toda fronteira é desconcertante: ela é o lugar onde o sentimento de identidade nacional é despertado e desafiado. Mas o que faz a experiência de percorrer os 3.140 quilômetros da fronteira entre os Estados Unidos e o México tão chocante não
é a diferença de cultura, nem de língua, nem de sistema político entre os dois países. É viver entre dois mundos: o Primeiro Mundo e o Terceiro Mundo, que se estende dali para o Sul, por todo o interior do México e para além, pela América Central e América do Sul. A fronteira Estados Unidos-México é a linha que separa a Colônia do Império, a desesperança da esperança, o Norte industrial da miséria do Hemisfério Sul.  

Nos anos recentes, essa linha divisória tornou-se ainda mais fascinante. As empresas norte-americanas começaram a transferir fábricas especiais, destinadas basicamente à montagem -as chamadas maquiladoras- para o lado mexicano, a fim de tirar vantagem da força de trabalho barata e passiva. Esse processo se desenvolveu de tal maneira que se converteu num exemplo visível a olho nu, numa metáfora do capitalismo global contemporâneo. Tornou-se um campo de batalha onde milhares de despossuídos, não só do México, mas de outros países arruinados, lutam dia e noite, desafiam a polícia de fronteira norte-americana, enfrentam perigos e até a morte, por um lugar ao sol, por uma migalha da prosperidade norte-americana. Tornou-se uma ilustração do dilema do desenvolvimento posto pela economia global. Podem países subdesenvolvidos como o México (Brasil, Coréia, Tailândia...) conseguir prosperidade se abrem completamente suas fronteiras para a competição estrangeira e põem sua força de trabalho em uma linha de montagem global? Podem os Estados Unidos manter o esplêndido isolamento de um alto padrão de vida se dependem tão vitalmente da força de trabalho de baixos salários atraída e amontoada a um passo da linha de sua fronteira?

A ideologia do livre comércio encontra na fronteira Estados Unidos-México também o questionamento dos seus limites. Como é possível defender a liberdade total de circulação do capital e das mercadorias e, ao mesmo tempo, se construir um muro sofisticado e agressivo para impedir a livre circulação dos trabalhadores? Como pode ser sincero o brado de "abaixo todas as fronteiras" ao mesmo tempo em que se erguem muros para conter a onda daqueles desesperados que em seus países vão sendo excluídos da vida econômica pelo desemprego e a falta de oportunidades, causados exatamente por esse mesmo processo de abertura total dos mercados?

Há muitas formas de tentar responder a essas questões. Uma delas é o jornalismo. E essa é a nossa forma. Nós enviamos Carlos Azevedo, um repórter, para ver essa fronteira enigmática e nos contar o que viu. [Ver mais]


Música de fundo em arquivo MIDI (experimental):
"Blues for piano"

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Belo Horizonte, 15 de novembro de 2003

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